Publicado por Redação em Mercado - 30/11/2023

Mulheres buscam flexibilidade ao empreender, mas 52% têm dificuldade de conciliar dupla jornada



Pesquisas relacionadas à economia do cuidado e seu impacto nas carreiras femininas renderam o Nobel de Economia à pesquisadora Claudia Goldin este ano. O assunto – como o trabalho doméstico recai desproporcionalmente sobre as mulheres – também foi tema da redação do Enem. Enquanto muitas delas (e especialmente as que são mães) decidem empreender em nome da flexibilidade, 52% têm dificuldades em conciliar essa dupla jornada – trabalho doméstico e negócios, segundo uma pesquisa da startup Olhi. “Muitos ainda associam os cuidados voltados para a manutenção da saúde e do bem-estar como um dever feminino”, diz Stefanie Schmitt, CEO da Olhi.

Essa visão prejudica o desenvolvimento profissional das mulheres, além de desencadear um quadro de exaustão – física e mental. A sobrecarga de trabalho doméstico e as jornadas profissionais excessivas estão entre as razões que explicam por que 45% das mulheres receberam um diagnóstico de ansiedade, depressão ou algum tipo de transtorno mental, segundo levantamento da Think Olga, ONG voltada a questões de gênero.

Um outro estudo, feito pela Motherly, uma plataforma norte-americana de conteúdo para mães, mostra que a saúde mental é a maior preocupação delas no mercado de trabalho. O alto custo dos cuidados com os filhos afeta a forma como essas mulheres conduzem suas carreiras: 70% dizem que tiveram que fazer sacrifícios para atender às necessidades de suas famílias, e 50% citaram o cuidado dos filhos como o principal motivo. 

A pesquisa da Olhi, marketplace de serviços voltados a empreendedoras, ouviu 235 empreendedoras, e 30% delas decidiram fundar seus próprios negócios para conciliar trabalho e maternidade. Isso porque 38,3% dedicam cerca de duas horas por dia ao trabalho doméstico e 39,1% precisam de até quatro horas para essas atividades. 

As mulheres realizam mais de três quartos do trabalho de cuidado não remunerado no mundo – 12,5 bilhões de horas todos os dias, segundo a organização global contra as desigualdades Oxfam (Comitê de Oxford para o Alívio da Fome). Mais especificamente, as brasileiras dedicam até 25 horas por semana a afazeres domésticos e cuidados, enquanto os homens dedicam cerca de 11 horas, segundo um estudo do FGV IBRE divulgado em outubro deste ano. “É uma visão patriarcal, que resulta em exaustão e restringe o desenvolvimento profissional das mulheres”, diz Schmitt, CEO da Olhi, sobre a divisão desproporcional desse trabalho.

Segundo a pesquisa, quase 55% das empreendedoras precisam conciliar sozinhas os negócios com o trabalho doméstico, contra apenas 18,3% que contam com a ajuda de amigos ou familiares. 

Os impactos disso também afetam os negócios. Mais de 70% se incomodam com a forma como a dupla jornada prejudica seu desempenho no trabalho. E quase 80% relatam impactos diretos no bem-estar de pessoas à sua volta. “A invisibilidade da carga do cuidado é mais um fator impactando a saúde mental das mulheres”, diz Schmitt. 47,7% se sentem frequentemente cansadas e mais de 50% foram diagnosticadas com algum transtorno mental – incluindo ansiedade (45,1%) e depressão (20%).

Para a empreendedora, mudar esse cenário passa, necessariamente, por valorizar o trabalho de cuidado e dividi-lo de forma adequada para que as mulheres tenham espaço para evoluir nos seus negócios. “O mercado não trata o empreendimento feminino como o masculino, inclusive porque pensa que cabe a elas cuidar, não trabalhar fora. No entanto, são elas que pagam a conta da metade dos lares brasileiros hoje.”


Empreendedoras contam os conselhos que dariam para suas versões do passado


Patricia Lima, fundadora e CEO da Simple Organic
“Não se cobre tanto. Sempre exigi demais de mim mesma, sofria com falhas e erros, o que é comum no cotidiano de um empreendedor, perfeição não é possível na prática. Errar faz parte do processo do empreendedorismo, não há estabilidade na jornada de inovação. Pelo contrário, é através dos erros que a gente aprende, desenvolve e se fortalece. Mas com o passar do tempo, acolhi a mim mesma, decidi que merecia me cobrar menos e isso fez toda a diferença. Com certeza eu teria feito isso antes, diria pra mim mesma que nem sempre será possível equilibrar todos os pratos, escalar uma empresa tem muito esforço, foco envolvido e em alguns momentos você não vai conseguir cumprir tudo que deseja, é preciso ter equilíbrio e gestão emocional. Principalmente com nós mesmas.”

Rosangela Silva, cofundadora da Negra Rosa
“Ter mais disciplina, que é uma coisa que eu busco até hoje. Você tendo mais disciplina, muitas coisas que às vezes você deixa para fazer em cima da hora que causam estresse você poderia fazer de uma forma muito mais tranquila e que poderia ter resultados melhores. Isso se aplica a tudo: a pensar conteúdo, a roteiro, produções a fazer, como preciso em toda a parte de criação, que é meu foco na Negra Rosa. Se você planeja melhor, você tem mais tempo de execução e tudo flui de uma forma mais fácil – até porque empreender já desgasta bastante.”

Ingrid Barth, cofundadora e COO da fintech Linker, presidente da ABStartups
“Diria para ser mais calma, menos focada no trabalho do dia a dia e para olhar para os lados e para as pessoas ao redor que podem ser suas aliadas. Gastar bastante tempo validando sua tese. Faça pesquisa, fale com os clientes, mapeie e estude concorrentes.
Cliente paga para ser bem tratado. Capriche nas áreas de experiência do cliente e tenha um atendimento o mais humanizado possível.”

Mariana Vasconcelos, cofundadora e CEO da Agrosmart, empresa de sensores inteligentes para o campo
“Uma coisa que eu sempre disse para mim mesma é: ‘Tem medo, vai com medo mesmo’. E normalizar esse sentimento de insegurança, não deixando isso me congelar para agir. Também, não deixe que o que as pessoas assumem sobre você seja verdade. Muitas vezes, quando a gente tá empreendendo a gente ouve: ‘Você não é feita para isso’ ou ‘Você tem que ser assim ou fazer tal coisa’. Isso não te define. Acho que a opinião alheia não me define e eu posso virar o que eu quero ser ou o que eu preciso ser para a minha empresa.”

Emily Ewell, cofundadora e CEO da Pantys
“Procure seu propósito como empreendedora, pessoa e profissional e alinhe isso com seu negócio. Só assim poderemos ser humildes em tempos de sucesso e conquistas e permanecer equilibrados em tempos turbulentos. Empreender é um estilo de vida com muito potencial de impacto, mas também conta com estresses e responsabilidades, e com propósito, fica mais fácil equilibrar a parte racional com o coração no longo prazo.”

Ana Isabel Carvalho Pinto, cofundadora Icomm Group e Shop2gether
“Para construir um negócio pautado no pioneirismo e em curadoria, principalmente quando pensamos em moda e lifestyle, é necessário fazer diferente, pensar de maneira inovadora e enxergar de maneira resiliente os desafios no caminho. Por isso, se eu pudesse dar um conselho a mim mesma no passado seria: seguir em frente, ter a coragem de confiar em si mesma, se ouvir e não ter medo de buscar o novo, sempre respeitando aquilo que você acredita. Além disso, diria para sempre se cercar de pessoas que complementam sua sabedoria, aprendendo e se desenvolvendo em conjunto. Afinal, nada se constrói sozinho.”

Kamila Camilo, fundadora e diretora-executiva da Creators Academy e líder da Davos Academy
“Eu diria a Kami do passado para procurar mentores mais cedo e continuar dizendo ‘sim’ às oportunidades. Eu diria para ela confiar sempre que tiver insights sobre as pessoas, conjunturas e situações. A síndrome da impostora é só mais uma invenção das estruturas da sociedade para fazer a gente desacreditar de quem somos. Portanto, eu asseguraria a Kami do passado de que ela pertence a todos os lugares que ela colocar os pés. Por esse caminho, eu aconselharia ainda que ‘ela’ trabalhasse sua autoconfiança desde cedo, porque isso muda completamente o cenário quando você está diante de uma negociação. Por fim, eu diria: ‘Kami, apoiar os sonhos das pessoas é maravilhoso, mas colocar energia no próprio sonho é transformador e tem um poder indescritível para a alma'”.

Lela Brandão, fundadora da marca de roupas Lela Brandão Co. e influenciadora
“Se eu pudesse falar com a Lela do passado eu daria dois conselhos. O primeiro seria: cuide da sua comunidade com muito carinho e dedicação, ela é seu bem mais precioso, são essas pessoas que vão apoiar e viabilizar seus projetos no futuro. E o segundo e talvez mais importante: converse com outras mulheres empreendedoras. Não tenha vergonha e nem veja elas como competição, converse com elas o quanto antes. Isso vai mudar o seu jeito de empreender e liderar.”

Isabela Chusid, fundadora e CEO da marca de sandálias veganas Linus
“Você vai enfrentar diversos desafios durante o seu percurso e o maior deles será confiar na sua capacidade. Nos momentos de incerteza, analise todos os dados, converse com pessoas que tenham mais experiência que você e, ainda sim, siga a sua intuição. No final das contas, ela é sua maior aliada no processo de tomada de decisão e principalmente na construção da sua autoconfiança”.

Duda Franklin, cofundadora e CEO da Orby, startup de reabilitação neurológica
“Persista nos seus objetivos, trace metas claras e seja resistente. As adversidades sempre vão aparecer sendo parte da jornada. Então, nesse momento, você precisa focar, cuidar da sua pessoa como ser humano. Acima disso, toda vez que um problema aparecer, foque na solução e estude, porque sempre vale a pena aprender coisas novas. Se divirta na jornada. Ela muitas vezes é árdua, mas no final sempre é recompensadora.”

Duda Camargo, cofundadora, COO e CMO da Pantys
“Permaneça aberta a se reinventar, mudar a rota e desenhar novas estratégias para enfrentar obstáculos não planejados, estando sempre à frente do mercado e alcançando os objetivos de longo prazo do seu negócio. Para isso, continue persistindo em não deixar de investir em inovação e continue disposta a ouvir e compreender as necessidades da sua comunidade. Muitas vezes, a resposta para os desafios e oportunidades de melhoria está mais perto do que se imagina e pode ser descoberta com uma simples escuta atenta às pessoas envolvidas no seu negócio, com insights valiosos e ideias inovadoras, garantindo o crescimento e sucesso do seu negócio.”

Marcella Zambardino, sócia fundadora e diretora de impacto da startup de produtos ecológicos positiv.a
“Confie plenamente em sua capacidade, pois a força de sua ideia é extraordinária. Nossa verdadeira potência emerge quando desafiamos o status quo, transformando inconformidades em soluções inovadoras. Reforce a autenticidade de sua marca e estabeleça conexões sólidas com a comunidade, é nesse vínculo genuíno que residem as bases do sucesso empreendedor. O empreendedorismo feminino é sobre colaboração e não competição. Esteja cercada de mulheres inspiradoras. Faça junto! Não hesite em investir ainda mais nesses pilares, eles que moldarão uma trajetória empreendedora sólida e inspiradora”.

Letícia Correia, fundadora e estilista da marca de moda íntima Ava Intimates
“Tenha coragem para assumir o imperfeito e se jogar nas oportunidades. Recentemente compartilhei um trecho de um livro que dizia assim coisas boas não esperam até a gente estar pronto, às vezes chegam antes, quando estamos quase lá, quando isso acontece, podemos deixar passar como ônibus errado ou ficar pronto, e eu fiquei. Empreender requer saber o momento de se jogar, saber pular de cabeça nas oportunidades e ouvir nossa intuição. Não comecei com o produto perfeito, eu abri lojas e abracei projetos com medo de não dar conta, e não é que eu dei? Então tenha dedicação, acredite e confie em você”.


 

Fonte: Forbes

 


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