Publicado por Redação em Gestão do RH - 11/08/2023

Fit cultural ou contribuição cultural? Entenda qual prática pode ser discriminatória

Por que avaliar a contribuição cultural é melhor do que avaliar o fit cultural

Colunista Mundo RH, Vicky Napolitano,  líder de Belonging & Organisational Culture da Pismo

Qual é a melhor forma de prever boa performance no processo seletivo? Perguntas como essa vêm sendo feitas há muito tempo no ambiente corporativo. Na busca pela resposta, passamos por algumas fases, pelos brain teasers nas entrevistas, pela contratação apenas em universidades específicas, pelas expectativas irreais em descrições de vagas e pelo nosso tópico de hoje: o famigerado fit cultural, do inglês cultural fit.

O que todas essas fases têm em comum? Elas perpetuam a discriminação sistêmica e criam barreiras para que as empresas não contratem ou retenham talentos diversos, especialmente pessoas historicamente excluídas da sociedade.

Uma das primeiras coisas em que precisamos pensar quando falamos de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) é em como mitigar os efeitos da discriminação sistêmica que permeia a sociedade de forma estrutural, institucional e individual.

É importante termos a mentalidade correta para encarar os passos necessários para promover uma mudança que seja efetiva e que promova representação diversa, inclusão de pessoas historicamente excluídas e mecanismos que gerem equidade e justiça.

Em um artigo na Forbes, a autora do livro Pedigree: How Elite Students Get Elite Jobs”, Lauren Rivera, traz os destaques de um estudo conduzido com 120 pessoas tomadoras de decisões de recrutamento na elite do mercado financeiro, jurídico e de consultoria estratégica. Nesse estudo, 82% das pessoas envolvidas dizem que o fit cultural é uma das coisas mais importantes ao se avaliar uma pessoa candidata. Mas apenas metade tem uma noção clara de qual é sua cultura organizacional.

Se nem todo mundo que avalia o fit cultural de pessoas candidatas conhece a cultura organizacional, como o sucesso é definido? Quais são as habilidades que estão sendo avaliadas?

Se não temos respostas estruturadas para essas perguntas, muito provavelmente temos um processo controverso de contratação.

Essas avaliações culturais são subjetivas e tornam-se barreiras ao trabalharmos a pauta de DEI. Isso acontece por alguns motivos:

Vieses inconscientes — Desde muito cedo temos nosso pensamento moldado pelo contexto e pela época em que habitamos. Ou seja, se não trouxermos consciência desses vieses, vamos replicar comportamentos e pensamentos que contribuem para a existência de privilégios e opressões.

Sem intenção e ação, não há resultado — Precisamos reescrever os nossos processos e políticas com um olhar intencional. A maioria das políticas e processos corporativos não foram criados por times diversos – incluindo os processos de atração, contratação e retenção de talentos. Isso reduz muito a probabilidade de se promover inclusão. Em empresas brasileiras, tomando como exemplo a diversidade racial, menos de 30% dos cargos de liderança são ocupados por pessoas negras. Numa visão mais ampla, apenas 17,5% das empresas Fortune 500 tem CEOs que são pessoas de grupos minorizados.

As pessoas não cabem em “caixas” — Exigir que as pessoas tenham os mesmo valores, competências e comportamentos de determinada pessoa “high-performer” é limitar a avaliação do que é sucesso para você e sua empresa. Por outro lado, avaliar a contribuição cultural que uma pessoa pode trazer (a adição cultural) é uma das formas mais inclusivas e eficazes de conduzir o processo. Perguntar “o que está faltando” e “aonde queremos chegar” ajuda a entender quais habilidades e características contribuem para a cultura atual.

Por que avaliar a contribuição cultural é melhor do que avaliar o fit cultural

O conceito de fit cultural baseia-se na intenção de fazer as pessoas se encaixarem nas expectativas previamente estabelecidas sobre o que é o sucesso naquela organização. Como cultura é algo intangível e que muitas vezes não é claro para as pessoas da organização, isso acaba se tornando um fator que impulsiona a desigualdade e que projeta comportamentos específicos injustamente nas pessoas.

Quem nunca ouviu frases como estas?

”Para trabalhar aqui tem de ter brilho nos olhos!”

”A pessoa tem de falar bem, ser firme, para ter sucesso aqui.”

”Buscamos protagonismo, uma pessoa que saiba se posicionar e tomar as rédeas.”

”Para trabalhar aqui tem de ‘se virar nos trinta’.”

”Contratamos apenas pessoas da universidade X porque já sabemos que têm o perfil ideal.”

”Essa pessoa me olhou nos olhos e falou bem. Ela é a certa pra nós.”

Ou até:

”Não temos pessoas como ela. Talvez ela não se encaixe na organização.”

”Ela tem um perfil muito diferente do que geralmente contratamos. Não vai dar certo.”

”Não temos um banheiro para essa pessoa usar.”

Todas essas falas estão carregadas de vieses inconscientes e muitas vezes projetam o sucesso em um perfil específico de pessoa que geralmente é branca, cisgênero, sem deficiências, neurotípica, heterosexual, extrovertida, sem filhos e de classe média/alta.

Quando avaliamos algo tão abstrato e restrito quanto o fit cultural, nós rejeitamos pessoas candidatas que poderiam contribuir positivamente no time, no departamento e na organização. Para evitar isso, é necessário buscar habilidades complementares e experiências transferíveis e, com isso, oferecer segurança psicológica.

Considerar a contribuição cultural, em vez do fit cultural, permite saber como aquela pessoa colaboradora ou candidata pode trazer contribuições à cultura da organização. É muito mais do que se encaixar em um parâmetro pré-estabelecido que, muitas vezes, é resultado de falta de definição, vieses inconscientes e “gut feeling”.

 

Com isso, podemos fazer as perguntas certas:

Será que meu processo de recrutamento ou de avaliação de desempenho está excluindo algum perfil inconscientemente?

Eu tenho parâmetros claros, evidências e exemplos concretos de sucesso para fazer uma avaliação?

Essa pessoa que estou avaliando consegue trazer uma perspectiva que vá desafiar nossos pensamentos e processos?

Essa pessoa consegue trazer uma dimensão de cultura que hoje nos falta?

Por último, de acordo com estudos do Pew Research Centera geração Z é a mais diversa até hoje. Essa geração será 25% da força de trabalho até 2025. Será que a falta de adequação de seus processos e políticas a ela não estaria impedindo você e sua empresa de alcançarem um pool de talentos capacitados mais amplo?


 

Fonte: Mundo RH


Posts relacionados


Deixe seu Comentário:

=