Publicado por Redação em Saúde Empresarial - 03/08/2015

Durante a crise hídrica, casos de diarreia se multiplicam em São Paulo

Moradores de Itu procuram água em bicas, em 2014.

Clonada do DNA humano, a proteína formadora de osso cria um novo material natural na boca do paciente a partir de estímulos do próprio organismo.

Os casos de diarreia aguda tiveram um aumento importante no Estado de São Paulo em 2014, associado à crise hídrica. A avaliação é do próprio Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE), órgão da Secretaria Estadual de Saúde, ligado ao Governo Geraldo Alckmin (PSDB). O centro qualificou 2014 como um ano “hiper-epidêmico”, após uma análise detalhada, embora preliminar, das notificações de surtos da doença. O órgão associa o evidente aumento de casos comunicados – quase 35.000 em algumas semanas de fevereiro, março e setembro – aos problemas de abastecimento de água que ainda afetam toda a região metropolitana e várias cidades do interior. “A crise hídrica escancara problemas que não são novos em relação à água e ao saneamento em São Paulo e no Brasil”, considera o estudo.

Na série histórica dos seis anos anteriores à crise, 2008 a 2013, a média do Estado mostra que o número de casos se situava entre 15.000 e 20.000, nunca superando os 25.000. Nessa série, setembro aparece sempre como um mês crítico e registra o maior número de notificações anuais, superando um pouco mais de 20.000.

A diminuição de pressão, a intermitência do abastecimento, o racionamento, o consumo do volume morto das represas, e o uso da água de poços e caminhões-pipa, cuja qualidade não é sempre fiscalizada conforme a lei, são as principais causas que podem comprometer a qualidade da água e promover o surgimento de surtos (ocorrência de dois ou mais casos) de diarreia e outras doenças transmissíveis pela água, conforme aponta a pesquisa do CVE.

O estudo identifica cenários relevantes como o da capital e os de outros sete municípios do interior – Campinas (norte), Tambaú (noroeste), Mogi das Cruzes (região leste), Araraquara (centro), Piracicaba (noroeste), São José do Rio Preto (noroeste) e São João da Boa Vista (centro-leste) – observou-se o aumento de atendimentos com concentrações muito mais altas em determinados momentos do ano, que coincidem com os períodos mais críticos da crise, como o final da estação da seca.

No caso de Tambaú, município de 23.000 habitantes, os casos de diarreia dispararam de menos de uma dezena até mais de 90 a partir de 16 de agosto de 2014, quatro dias antes de a cidade decretar estado de calamidade por falta de água. O número de casos não voltou à normalidade até novembro, embora até fevereiro deste ano a média de notificações continuou superior à verificada no mesmo período de 2014.

Os períodos de janeiro a abril e de agosto a setembro do ano passado foram críticos no conjunto do Estado. A análise é feita com base nas chamadas semanas epidemiológicas, que começam no domingo e terminam no sábado seguinte. No período de 9 a 15 de fevereiro foram registrados quase 35.000 casos no Estado, assim como na semana entre 7 e 13 de setembro, onde o número foi similar. Durante o resto das semanas, o índice de notificações não caiu abaixo de 15.000. O número de casos, entretanto, pode ser ainda maior. Em outro estudo do tipo de 2005, a médica e sanitarista Maria Bernardete de Paula Eduardo, que ocupava a diretoria da Divisão de Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar do CVE desde 1999, demonstra que apenas 40% das pessoas que têm a doença procuram o serviços de saúde, que passaram a notificar os atendimentos por diarreia em 2000.

Fonte: DDTHA/CVE/CCD/SES-SP (SIVEP_DDA) DC – anos de 2008 a 2013

As primeiras conclusões deste levantamento foram apresentadas em maio pela atual diretora da Divisão de Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar do centro, Eliane Suzuki, com dados coletados e analisados pelo departamento público. Na intervenção, feita em um seminário sobre segurança da água para consumo humano, ocorrido na Faculdade de Saúde Pública da USP, Suzuki afirmou: “Se vê claramente que o número [de casos de 2104] é maior. Isto evidencia que com a falta de água e as consequências que isso traz, 2014 foi um ano hiper-epidêmico”. A apresentação está disponível, a partir do minuto 79, no site da USP.

O EL PAÍS mostrou em reportagem de maio deste ano que a contaminação do encanamento de água potável, com terra ou esgoto, pode deixar uma rua inteira doente. Os moradores do Jardim Conceição, um bairro pobre de Osasco, relataram que em fevereiro deste ano, famílias inteiras apresentaram sintomas como vômitos e diarreia. “A água da rede de esgoto se misturou com a das tubulações”, afirmou Nazaré, de 46 anos, uma das afetadas. “A água que saía da torneira tinha cheiro de merda, e a rua inteira ficou doente”. A Sabesp afirmou na época que o que poluiu a água foi terra e que a avaria foi consertada em três dias. “Nós não confiamos mais nessa água, muito menos para dar às crianças”, dizia a jovem Janaína Dias. O estrago, disse, os deixou 15 dias sem água.

Outros casos foram revelados pela imprensa, antes das autoridades agirem, durante o ano passado. Em agosto de 2014, o município de Brodowski, a 339 quilômetros de São Paulo, registrou 195 casos de pessoas com vômitos e diarreia em 15 dias, segundo informou a Folha de S. Paulo. O Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Brodowski (Saaeb) não descartou a possibilidade de as pessoas terem sido contaminadas pela água, após o abastecimento ser relegado aos caminhões-pipa. Também em agosto, moradores de Redenção da Serra, município atendido pela Sabesp a 163 quilômetros da capital, sofreram nos seus estômagos a seca da sua represa e um problema na estação de tratamento de água, segundo noticiou o portal G1.

Já em março deste ano, Moradores do Jardim Turquesa, no M'Boi Mirim (zona sul de São Paulo) receberam água com cheiro de esgoto e, segundo o diário Agora, ao menos 57 pessoas passaram mal com diarreia, vômito, dor de cabeça ou febre, após contato com a água malcheirosa e de cor amarronzada. O jornal levou o líquido a um laboratório, que constatou a presença de coliformes fecais (presentes nas fezes), o que torna a água imprópria para consumo, mesmo após fervura. A Sabesp negou e afirmou que a água atendia os padrões sem apresentar risco sanitário.

A Sabesp, que foi consultada pela incidência de doenças durante a crise hídrica nos municípios onde ela opera (São Paulo, Mogi das Cruzes e São João de Boa Vista), afirmou por meio da assessoria da imprensa que "a água distribuída à população está dentro dos parâmetros exigidos pela Portaria 2.914/2011, do Ministério da Saúde". A empresa disse que os resultados dos mais de 62.000 análises mensais que realiza são encaminhados para as vigilâncias sanitárias locais, conforme a lei.

A Secretaria de Saúde afirmou que os dados do estudo foram utilizados para debater a questão das doenças transmitidas por água e alimentos, "além de ajudarem na elaboração do plano de contingência em relação ao cenário de estiagem e crise hídrica". Questionada sobre por que a população não foi alertada sobre os riscos de doenças transmitidas pela água em um cenário de crise hídrica, a pasta afirmou que "cabe a cada município desencadear suas ações, de forma descentralizada, e alertar a população". A assessoria de imprensa negou entrevista com a responsável do departamento que fez o estudo e avaliou depois que a interpretação da reportagem sobre o mesmo, apesar de checada com diversas fontes, "é fruto de ansiedade porque o estudo ainda é meramente preliminar".

O rastro da Hepatite A

Além das diarreias e vômitos, a água contaminada também pode causar outras doenças mais graves, como a Hepatite A, uma inflação do fígado causada por um vírus transmitido pela ingestão de água ou alimentos contaminados com matéria fecal.

Em Carapicuíba, ao menos cinco pessoas tiveram Hepatite A nos últimos 15 dias em apenas duas ruas de um mesmo bairro. Eles começaram a sentir uma forte dor abdominal, fadiga, falta de apetite e perceberam que um tom amarelo tingiu seus olhos e pele. Luan, de sete anos, Rosângela, a mãe, e o jovem Willkner Eduardo Gama, de 21 anos, foram três das vítimas. “Fiz tratamento com soro e chá de picão [uma erva medicinal] e já estou bem, mas o médico me falou que foi por culpa da água que tinha bebido e não voltei a tomar da torneira. Aquele dia que eu fiquei doente, a água estava com uma cor amarela”, conta Willkner.

A doença, no entanto, permaneceu estável nos últimos anos em São Paulo e tende a desaparecer graças a uma vacina específica aplicada nas crianças, conforme informações do CVE. No ano passado, foram registrados 16 surtos, com até 60 casos no mês de setembro. Um surto é considerado a partir de dois casos na mesma fonte, no mesmo lugar e no mesmo período de tempo.

Fonte: Terra Saúde Bucal


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