Publicado por Redação em Notícias Gerais - 06/11/2015
Deputados derrubam proposta de combate à sonegação
Medida apresentada por Joaquim Levy foi recomendada pela OCDE em um esforço global contra sonegadores
A Organização Para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) é um clube de países ricos atualmente empenhado em disseminar pelo mundo propostas de combate à sonegação de impostos. Em viagem ao Brasil nos últimos dias, seu secretário-geral, Angel Gurría, tratou do assunto com Dilma Rousseff e com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Deve ter voltado para a casa decepcionado.
Enquanto Levy e Gurría reuniam-se na terça-feira 3, a Câmara derrubou uma proposta anti-sonegação apresentada pelo Ministério da Fazenda por inspiração da OCDE. A proposta obrigava os contribuintes a informar uma vez por ano à Receita Federal todas as operações feitas para pagar menos imposto, o chamado planejamento tributário. Nada feito: 239 deputados votaram contra e só 169, a favor.
Na justificativa enviada ao Congresso junto com a proposta, Levy dizia que a “medida estimula uma postura mais cautelosa por parte dos jurisdicionados [contribuintes] antes de fazer uso de planejamentos tributários agressivos”.
O governo anda surpreso com o tamanho da criatividade empregada pelos contribuintes para fugir do Leão. Na Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, há quem identifique operações a resvalar a ilegalidade.
Para enfrentar isso, a ideia era que o Fisco pudesse analisar as operações de planejamento tributário e, caso as considerasse acintosamente sonegadoras, tivesse o direito de cobrar o imposto devido. E mais: de multar o contribuinte em 150% do valor do imposto caso a declaração não fosse entregue ou aceita.
Na justificativa, Levy citava a OCDE como fonte de inspiração para a ideia do informe obrigatório, modelo já experimentado nos Estados Unidos, Inglaterra, Portugal, Canadá, Irlanda e África do Sul.
A declaração obrigatória é um dos itens de um pacote que a OCDE tenta emplacar pelo mundo no combate à sonegação, o Plano de Ação sobre Erosão da Base Tributária e Transferência de Lucros. Lançado em 2013, o Beps, na sigla em inglês, recomenda aos governos “exigir dos contribuintes que divulguem os seus arranjos de planejamento fiscal agressivos”.
Em um documento após um encontro em Paris este ano, a OCDE diz que os principais objetivos do informe obrigatório são desvendar esquemas de evasão fiscal, identificar seus autores e reduzir a prática. “A maioria dos regimes de divulgação obrigatória existentes são bem-sucedidos em termos de cumprimento desses objetivos”, afirma.
No Brasil, a proposta foi bombardeada desde sua apresentação por Joaquim Ley. Os porta-vozes da resistência foram sobretudo advogados tributaristas, presumivelmente donos de clientes praticantes de planejamento tributário.
Uma amostra da crítica foi vista no dia que os deputados derrubaram a proposta. Em uma audiência pública na Câmara, Marcelo Knopfelmacher, presidente do Movimento de Defesa da Advocacia, disse que o Brasil não devia “importar conceitos”, pois aqui “ninguém aguenta mais pagar imposto”. Uma visão, disse ele, extensiva a medidas de cerco ao planejamento tributário.
Diante da enxurrada de críticas, houve uma tentativa do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) de salvar a proposta, amenizando-a.
O tucano era o relator em uma comissão especial de deputados e senadores que examinou a medida provisória 685, dentro da qual estava a regra de declaração obrigatória. Em seu parecer, ele acabou com a multa de 150%. E dizia que deveriam ser entregues à Receita informes de operações descritas previamente em uma lista do Leão. Era preciso, escreveu Jereissati, “criar regramento adequado e seguro para o tratamento da elisão fiscal abusiva, ou seja, do planejamento tributário ilícito”.
Não adiantou. O abrandamento foi insuficiente até para convencer os deputados do partido de Jereissati. Dos 47 tucanos presentes à votação na Câmara, só um, o baiano Jutahy Junior, votou a favor do informe obrigatório. A oposição (PSDB, DEM, PPS, PSB, Solidariedade) em peso ficou contra.
Entre os governistas, um festival de traições. No PMDB, maior aliado do governo, 30 votaram contra a proposta e 24 a favor. No PT de Dilma Rousseff, três dos 56 votantes disseram “não”. No PSD, controlador do Ministério das Cidades, dos 27 votantes, só três disseram “sim”. No PP, à frente do Ministério da Integração Nacional, foram 15 votos contra e 13 a favor.
Fonte: Revista Carta Capital