Publicado por Redação em Gestão do RH - 19/02/2020
Bolsa ainda receberá bilhões de reais de fundos de pensão, diz consultoria
A chegada de novos investidores é um dos principais motores que impulsionaram as fortes valorizações da Bolsa de Valores nos últimos anos. São pequenos investidores, fundos de investimentos, bancos e empresas que vêm trocando aos poucos suas aplicações em renda fixa por outras opções mais arrojadas, em busca dos retornos que aplicações conservadores como títulos públicos já não dão mais.
Há, entretanto, um último grupo dentre os investidores domésticos que ainda mal começou esse caminho: a trilionária indústria dos fundos de pensão. A boa notícia é que, em algum momento muito próximo, isso vai acontecer, e será uma injeção cavalar de dinheiro no mercado de ações – o que, em última instância, é o que faz com que ele se valorize.
“Estamos falando de bilhões e bilhões de reais que eles têm para levar para a Bolsa de Valores, e é um fluxo que será inevitável”, diz Guilherme Benites, sócio da Aditus, uma das principais consultorias de investimentos para fundos de pensão do país.
Os fundos de pensão são os planos de previdência privada fornecidos por empresas a seus empregados. Eles são os responsáveis pela aposentadoria complementar de 3,5 milhões de brasileiros e gerenciam uma fortuna que equivale a 13% do PIB. Seus investimentos, somados, chegaram a 926 bilhões de reais no ano passado, sendo 19% em ações (170 bilhões de reais), de acordo com a Abrapp, a associação do setor.
Essa proporção praticamente não se mexe desde 2015 e, em 2013, chegou inclusive a ser maior, de 30%, mesmo que os juros, à época, fossem mais polpudos do que hoje (em 2013, a Selic subiu a 10% ao ano; em 2020, caiu a 4,25%). Para se ter uma ideia, se a fatia do dinheiro desses fundos em renda variável subisse, hoje, dos 19% atuais para os 30% do passado, já seriam 100 bilhões de reais a mais no mercado de ações. É mais que o dobro do que os 44,5 bilhões de reais que os estrangeiros levaram embora da Bolsa brasileira em 2019.
Em conversa com o site de EXAME, Benites, da Aditus, explicou o porquê dessa demora no rebalanceamento da carteira do setor e, ao mesmo tempo, porque acredita que ela seja inevitável. Veja os principais trechos:
Os fundos de pensão sempre foram tradicionais investidores de renda fixa, mas, com a queda dos juros às mínimas históricas, terão que tomar mais risco para manter a rentabilidade e garantir o pagamento das aposentadorias de suas beneficiários. Essa migração para a renda variável já está acontecendo?
É, de fato, uma questão que tem sido muito debatida no setor e é um fluxo que será inevitável. Afinal, qual alternativa sobrou? Com juros a 4,25%, mal dá mais para cobrir a inflação. É uma migração que está ainda acontecendo de maneira muito lenta, os fundos de pensão ainda têm muito menos do que poderiam em renda variável, mas ela vai acontecer. Mas não dá mais para falar que não quer ter renda variável. E estamos falando, aí, de bilhões e bilhões de reais que essas entidades ainda irão levar para a Bolsa de Valores.
De quanto é a participação das ações nos investimentos dos fundos de pensão, e de quanto poderia ser?
No total do setor, são hoje cerca de 20% em renda variável, de acordo com os dados da Abrapp. Isso já foi próximo de 30% no passado. Mas esses números acabam sendo muito distorcidos por conta dos grandes fundos. A Previ, por exemplo [fundo dos funcionários do Banco do Brasil], que é o maior, tem sozinha um quinto do mercado, e algo como 50% do seu patrimônio está em renda variável. Só que ela é um ponto fora da curva. Entre os fundos menores, que são a grande maioria, a participação da renda variável é de 9%. Com os novos direcionamentos para as políticas de investimentos em 2020, isso pode subir para 13% neste ano. Só entre os clientes que nós representamos, que são 120 fundos com 250 bilhões de reais em ativos, esse aumento de 4 pontos percentuais seria 10 bilhões de reais a mais para a Bolsa. E é só um pedaço do mercado.
Por que a participação da renda variável na carteira deles é ainda tão pequena na renda variável e por que a demora para que isso comece a mudar, mesmo com os juros em queda há mais de dois anos?
Um fator importante é que boa parte da carteira desses fundos ainda é formada por títulos de renda fixa mais antigos, de quando os juros estavam altos, e com vencimentos longos. Há títulos públicos ali pagando 6% de juros além da inflação. Hoje, os mesmos títulos dão 3% de juros. Conforme esses títulos vençam, e conforme os fundos precisem fazer novos aportes, será necessário ir para ativos mais arriscados e que ofereçam melhores possibilidades de ganhos.
Por sua natureza, os fundos de pensão têm um perfil de longuíssimo prazo para os investimentos, o que, em muitos aspectos, pode servir de referência para o pequeno investidor que quer investir pensando na aposentadoria ou no longo prazo. O que um fundo de pensão considera mais importante na hora de escolher uma ação?
Quando um fundo de pensão investe em Bolsa, ele está pensando em um horizonte de dois a três anos. E, diferentemente do que a maioria das pessoas fazem, não existe esse negócio de ficar procurando a ação que pode se multiplicar por cinco. É um setor que nem dá atenção para uma conversa dessas, esquece. É também um investimento não se mexe muito, que tem operação todos os dias ou fica tentando acertar o pico do preço para vender. Olha-se muito mais para os fundamentos da empresa, a liquidez e, sobretudo, a estabilidade. No fim das contas, aquilo que pode triplicar em dois anos é a mesma coisa que, em dois anos, pode valer zero.
Fonte: EXAME