Publicado por Redação em Gestão do RH - 23/09/2021
A sociedade do imperativo
“Quer ficar rico em 10 passos? Basta comprar esse curso exclusivo. E aprender a ganhar dinheiro no Instagram, você quer?” Também vão te ensinar. “Siga essa fórmula e ganhe milhões fazendo dancinha no TikTok!”
“Como assim, esses adolescentes ganham tanto dinheiro fazendo dancinha no TikTok e você, que fez MBA, ainda precisa trabalhar 12 horas por dia pra se manter em um emprego que mal paga suas contas?”
A internet vive uma nova epidemia. E ela não está sendo causada pelo coronavírus, mas sim pelos novos “gurus”, que se espalham tão rápido e se multiplicam como um vírus.
Quer emagrecer? Tem guru de nutrição, de atividade física, de estilo de vida. Cada um com sua metodologia I-N-F-A-L-I-V-E-L de 5 passos para secar a barriga comendo comidas saudáveis e deliciosas.
Quer chutar o emprego e virar empreendedor na internet? Tem guru que te ensina a “transformar seu Instagram em uma máquina de vendas”, você nunca mais vai precisar aguentar aquele chefe abusador.
Quer fazer o seu dinheiro render mais? Tem uma enxurrada de gente te dizendo como você ganha mais, usa bem o seu dinheiro e ainda faz ele render.
Nunca na história tivemos acesso a tantas frases no “imperativo”. O imperativo é um dos modos verbais de conjugação da língua portuguesa, assim como o modo indicativo e o modo subjuntivo. “Ele é usado para expressar ações que se exigem do interlocutor, por meio de ordens, pedidos, sugestões ou conselhos.”
“Se você fizer isso”, não vai alcançar a magreza, a riqueza, a beleza, a liberdade, a felicidade, mas sim a ansiedade. Doses cavalares de ansiedade.
A ansiedade e o medo são partes naturais do nosso mecanismo de sobrevivência, sendo algo normal e até, em certa dose, necessário. Mas essa ansiedade gerada pela sociedade do imperativo não está relacionada aos nossos instintos, mas sim a valores, que nos são impostos desde muito cedo.
Nesta sociedade do imperativo, somos ensinados que alcançar o sucesso não só é para todos, mas que ele está ao seu alcance se você fizer exatamente o que o guru diz.
Acorde as 5h da manhã, corra 10km por dia, beba 5 litros de água, faça jejum, trabalhe 15h por dia, aprenda as 100 habilidades de sucesso. Está tudo na sua mentalidade.
Mas o que seria o sucesso? Ter um carro importado e viajar para as Maldivas? Se a economia de mercado dita os valores, o senso comum nos ensina que “ter” se torna mais importante do que “ser”.
Ter coisas é bom? Sim, é ótimo! Aprender a ser uma pessoa melhor, a mudar de vida é bom? É ótimo! Não estou aqui desclassificando o trabalho de profissionais sérios que acreditam de verdade que podem melhorar a vida das pessoas. Mas este texto traz uma reflexão muito importante sobre essa sociedade do imperativo.
Somos bombardeados desde a infância por perguntas dos adultos: “O que você quer ser quando crescer?”, “Quantos filhos você vai ter?”, “Você joga bem futebol? Quem sabe vira profissional?”
Esse tipo de pergunta fica tão no automático que os adultos já fazem sem pensar nas consequências das pressões que isso gera.
Agora, quem de vocês sabia responder a essas perguntas na infância?
A verdade é que você, mesmo depois de adulto, ainda tem milhares de questionamentos sobre o que você quer para a sua vida, certo?
A sociedade do imperativo atualmente tem muito mais do que antes. Na verdade, nunca “tivemos” tantos bens materiais. Ora, se temos tanto, qual a razão de vivermos uma epidemia de ansiedade? Qual a razão de que crianças criadas em sociedades mais materialistas desenvolvem níveis mais elevados de ansiedade? Por que vemos tantas pessoas insatisfeitas, ansiosas, compulsivas por comida, por compras, por redes sociais, por aparência?
Por que queremos tanto e, mesmo com muito, ainda não é suficiente?
Porque ser simples não vende. Ser simples não demanda consumo e não gera lucro. Se você está feliz e em paz com a sua aparência, sua profissão, seus valores, com sua vida de forma geral, você não precisa correr atrás de coisas para validar a sua autoestima. Você não precisa se mostrar importante para os outros.
A verdade é que essa corrida maluca por magreza, beleza, riqueza e falsa felicidade só funciona com quem vive uma ansiosa busca por importância, por aprovação social. A sociedade do imperativo não se importa com o que você de fato é, com o que você de fato sente.
A sociedade do imperativo já tem o remédio para o que você precisa, mesmo sem saber o seu nome. E se você não precisa de nada, não busca nada, está satisfeito(a) com a sua vida, você não passa de alguém apático, acomodado, e, portanto, inferior.
Na próxima vez que você for “rolar o feed” em busca de algo que te falta, se lembre que a única resposta que você precisa está em você.
Seja fiel a sua essência. Busque autoconhecimento e se desprenda da necessidade de validar a sua autoestima com os outros. E tente se libertar de tanta gente te dizendo o que você deve fazer.
Fonte: InfoMoney