Publicado por Redação em Notícias Gerais - 12/08/2015

A indústria prostrada

Impostos

A falsa inserção competitiva da economia brasileira cobra o seu preço

Prostração industrial é o título do editorial publicado na edição de quarta-feira, 5 de agosto, pela Folha de S.Paulo sobre o desempenho da indústria brasileira nos últimos anos. Os resultados da atividade industrial são, de fato, deploráveis. No semestre, diz o editorialista, a retração chegou a 6,3%.

A última moda nos círculos bem-falantes e bem informados é pregar a integração da indústria nativa às cadeias globais de valor e clamar pelo aumento da produtividade. Essas recomendações equivalem às campanhas em defesa da saúde, contra a doença.

Em artigo recente, escrito em parceria com Júlio Gomes de Almeida, cuidamos da formação das chamadas cadeias globais de valor. Em nossa opinião, a redistribuição espacial da manufatura foi impulsionada por duas forças complementares: 1. O movimento competitivo da grande empresa transnacional para ocupar espaços demográficos de mão de obra abundante. 2. As políticas nacionais dos Estados soberanos nas áreas receptoras. Não é possível compreender a reestruturação e a dinâmica da produção e do comércio globais sem considerar essa concomitância entre os movimentos da grande empresa e as políticas nacionais, particularmente as da China e de seus vizinhos asiáticos.

A participação da indústria brasileira no PIB caiu de 35,8% em 1984 para 15,3% em 2011. Em 2014 escorregou para 13%. O leitor poderá comparar o índice brasileiro com os indicadores de alguns países, segundo dados da ONU de 2010: China, 43,1%; Coreia, 30,4%; e Alemanha, 20,8%. Aquela queda seria natural se decorresse dos ganhos de produtividade obtidos ou difundidos pelo crescimento da própria indústria, como ocorreu em países de industrialização madura, como os Estados Unidos (13,4%). Mas não foi isso o que se observou no Brasil.

Desde o crepúsculo dos anos 70, no momento em que ocorria a revolução tecnológica da informática, dos contêineres e da automação, companheiras da intensa redistribuição da capacidade produtiva manufatureira entre o centro e os emergentes, a indústria brasileira ficou para trás.

O Brasil encerrou os anos 90 com uma regressão da estrutura industrial, ou seja, não acompanhou o avanço e a diferenciação setorial da indústria manufatureira global e, ademais, perdeu competitividade e elos nas cadeias que conservou. Nos anos 2000, bafejado pelas energias da expansão sino-americana, o País foi abalroado não só pela demanda chinesa de commodities, mas também pelo crescimento elástico do comércio global de manufaturas.

No auge da bolha de crédito universal, nossa indústria “pegou uma beirada” na festança global. A balança comercial brasileira ilustra os altos e baixos da indústria de transformação: em 2006, nas culminâncias do crescimento sino-americano, o saldo do setor era positivo em 29,8 bilhões de dólares. Em 2011, cinco anos depois, o resultado foi negativo em 48,7 bilhões. Já em 2014, o déficit da indústria de transformação subiria a 63 bilhões de dólares.

Chamam a atenção os déficits em produtos químicos, bens de capital mecânicos, equipamentos de rádio, tevê e comunicação e veículos automotores. O resultado global do comércio exterior foi superavitário em 29,8 bilhões de dólares em 2011 (40 bilhões em 2006), graças ao extraordinário saldo em commodities agrícolas e minerais, de 78,5 bilhões de dólares (46,4 bilhões em 2006). Mas o superávit seria transformado em déficit de 4 bilhões em 2014, quando o saldo de commodities recuou para 59,5 bilhões.

A valorização da taxa de câmbio real (nesse caso, na contramão do Consenso de Washington), a privatização das empresas produtoras de insumos e serviços fundamentais e a elevação da carga tributária golpearam a indústria, o investimento e as exportações.

Fica claro que a falsa inserção competitiva da economia brasileira está cobrando o seu preço. Falsa, porque as políticas dos anos 90 entendiam que bastava expor a economia à concorrência externa e privatizar para lograr ganhos de eficiência micro e macroeconômica. Percorremos o caminho inverso dos asiáticos, que abriram a economia para as importações redutoras de custos.

A abertura asiática estava comprometida com os ganhos de produtividade voltados para o aumento das exportações. As relações importações/exportações faziam parte das políticas industriais, ou seja, do projeto que combinava o avanço das grandes empresas nacionais nos mercados globais e a proteção do mercado interno. As importações não tinham o objetivo de abastecer o consumo das populações. Estas se beneficiaram, sim, dos ganhos de produtividade e da diferenciação da estrutura produtiva assentada em elevadas taxas de investimento.

Fonte: Revista Carta Capital


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